Friday, June 19, 2020

Saúde mental em tempos de COVID-19

Quando a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou que a Covid-19, o novo coronavírus, tinha se tornado uma pandemia, o mundo praticamente parou. Um cenário de pânico e incertezas tinha sido criado: a preocupação com uma doença desconhecida, contagiosa e potencialmente fatal, especialmente para alguns casos; a especulação em torno de sua forma e rapidez de transmissão; a falta de um remédio eficaz e de uma vacina disponível.
A população foi adoecendo pelo novo coronavírus, lotando hospitais e sobrecarregando os sistemas de saúde. O alto número de mortes tem assustado a todos. Muitas pessoas estão perdendo seus entes queridos sem poder, ao menos, se despedir. O medo de se contaminar e até mesmo de morrer tem nos assombrado.
O isolamento social foi adotado para tentar reduzir o contágio da doença. Escolas, comércios, empresas, etc. e tal foram fechados. Viagens, festas, casamentos, muitos sonhos foram interrompidos. Logo surgiram os problemas financeiros como o desemprego, cortes de salário, fechamento de empresas, etc., aumentando ainda mais a desigualdade social.
O confinamento domiciliar durante a quarentena também tem causado grande impacto emocional. A falta da liberdade, pilar fundamental da democracia, traz a sensação de se estar preso dentro de casa. Em algumas situações, o ambiente tem se tornado tão difícil, que houve até aumento da violência doméstica. A maioria das pessoas tem sentido dificuldade em se adaptar às mudanças do dia a dia. A falta de atividade física e de atividades de lazer; a saudade da família, dos amigos, do convívio social; coisas que eram a exceção se tornaram rotina. Enfim, a solidão bateu.
Tudo isso tem deflagrado prejuízos no bem-estar físico e mental na população.
Em muitos lugares, o desespero foi tamanho, levando a população a fazer compras em massa de mantimentos, produtos de limpeza e equipamentos de proteção individual (EPIs). Com isso, o estoque de comércios se esgotou e deixou a população ainda mais insegura.
Outro problema sério que vem ocorrendo e se faz necessário alertar a população, é o perigo da automedicação. A divulgação de dados preliminares sobre possíveis eficácias de medicamentos no combate ao novo coronavírus, tem levado a população a se automedicar. Em alguns casos, os danos à saúde foram tão graves, que causaram intoxicação e até mesmo morte.
Não bastasse tudo isso, houve ainda até aqueles que não acreditassem na existência ou na gravidade do novo coronavírus, chegando a chamar a pandemia de “histeria coletiva.”
De fato, um cenário como esse, pode levar a população a beira de um ataque de nervos.
Eventos traumáticos, assim como a pandemia de Covid-19, podem causar ou agravar transtornos mentais, tais como: depressão, ansiedade, pânico, insônia, abuso de substâncias, estresse agudo e transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) e levar até ao suicídio, em casos extremos.
Os danos psicológicos causados pela pandemia podem atingir qualquer pessoa, independentemente de raça, gênero e classe social. Em especial, os profissionais de saúde têm apresentado uma maior prevalência de transtornos mentais, principalmente por enfrentar ambientes inadequados de trabalho, com alto risco de contaminação, com falta de EPIs, ausência de respiradores e leitos em UTI (unidades de terapia intensiva). Sem falar na sobrecarga de trabalho, exaustão física e emocional, na frustração das perdas de pacientes e na discriminação, muitas vezes sofrida.
Desde a antiguidade, as pandemias assombram a população, mas sem dúvida, a pandemia do novo coronavírus foi algo inesperado e desafia o mundo.
Infelizmente, é uma realidade que precisa ser enfrentada. Entender que todos estão na mesma situação, cuidar da saúde física e mental, ter compaixão e cuidados uns com os outros, mesmo estando longe. Respeitar as orientações da OMS, apoiar os profissionais de saúde, nunca se automedicar, buscar informações de fontes seguras, evitando notícias sensacionalistas. Procurar ajuda psicológica e psiquiátrica se o estresse sair do controle. E, acima de tudo, compreender que o surgimento do novo coronavírus fez surgir a necessidade de um “novo normal”.
Dra. Marina Odebrecht Rosa, CRM: 107447 – SP | RQE: 47901. Dr. Moacyr Alexandro Rosa, diretor técnico, CRM: 69816 – SP | RQE: 47876. IPAN – Instituto de Psiquiatria Avançada e Neuromodulação.
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Referências:
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